Equipes de ĂłrgĂŁos ambientais trabalham em conjunto para recuperar a fauna prejudicada pelas queimadas que atingiram a capital nas Ășltimas semanas
Um trabalho ininterrupto executado pelo Governo do Distrito Federal (GDF) para atender os animais vĂtimas dos incĂȘndios que atingiram o DF nas Ășltimas semanas tem promovido resgates e tratamentos por meio de ĂłrgĂŁos ambientais com a estrutura necessĂĄria para a recuperação da fauna do Cerrado.
No Hospital VeterinĂĄrio do ZoolĂłgico de BrasĂlia, atualmente, estĂŁo sendo atendidos uma anta e dois tamanduĂĄs, vĂtimas de queimadas. O macho de anta foi resgatado do fogo que consumiu parte do Parque Nacional na quarta-feira (18). Ele chegou ao zoo com as quatro patas gravemente queimadas, sem unhas, desidratado e com sinais de inalação de fumaça. Foi iniciado um tratamento especial com pele de tilĂĄpia, um mĂ©todo para queimaduras desenvolvido por mĂ©dicos no CearĂĄ e considerado um grande avanço na medicina devido Ă capacidade de eficĂĄcia na regeneração e cicatrização de ferimentos.
JĂĄ a tamanduĂĄ-bandeira fĂȘmea, vĂtima do incĂȘndio que se espalhou na Floresta Nacional, foi resgatada na segunda-feira (23) com queimaduras graves nas quatro patas e debilitada para procurar alimento. O filhote, por sua vez, chegou Ă unidade veterinĂĄria com queimaduras nos pĂ©s, mĂŁos e na ponta do focinho. Atualmente ele Ă© alimentado por sonda â e, como todos os demais pacientes, recebe cuidados para recuperação e reinserção na flora.
Segundo a diretora do Hospital Veterinårio do Zoológico, Tùnia Borges, os tratamentos alternativos incluem métodos fitoteråpicos e exames de todos os tipos para o monitoramento e melhora dos animais. Além disso, as equipes fazem uma busca ativa nas åreas atingidas pelo fogo para prestar apoio aos outros órgãos ambientais envolvidos nos resgates.
âColaboramos tambĂ©m com o fornecimento de alimentos para os animais, alĂ©m de materiais de contenção no caso do pessoal do parque precisar fazer algum resgateâ, detalha a gestora. âA equipe fica de prontidĂŁo 24 horas para atender da melhor forma possĂvel.â
Animais no Hfaus
O Hospital e Centro de Reabilitação da Fauna Silvestre (Hfaus) tambĂ©m recebeu diversos pacientes durante esse perĂodo. Na quarta-feira (25), um filhote de cachorro-do-mato foi encontrado por policiais militares do BatalhĂŁo de Policiamento Ambiental (BPMA).
O animal havia caĂdo em um buraco de cerca de trĂȘs metros de profundidade apĂłs se perder do bando para fugir de um incĂȘndio no NĂșcleo Rural Alexandre GusmĂŁo, em BrazlĂąndia. Depois de ser encaminhado ao Hfaus e passar por exames, teve constatada uma fratura na coluna e precisou ser submetido a cirurgia ortopĂ©dica. O bichinho passarĂĄ por tratamento e reabilitação.
Um filhote de lobo-guarå também recebe cuidados na unidade após ter sido encontrado debaixo de um carro. Apesar de não apresentar sinais de ferimentos, ele não estava em seu habitat natural e foi recolhido pelas equipes para não correr riscos de atropelamento, ataque de cães domésticos ou mesmo atacar por estar assustado.
O hospital veterinĂĄrio tambĂ©m acolheu um pequeno bugio, que chegou desidratado e com hipotermia. Um grupo de civis afirma ter visto o filhote de primata cair do colo da mĂŁe durante uma fuga do bando prĂłximo Ă s ĂĄreas afetadas pelas queimadas. Os veterinĂĄrios da unidade pĂșblica tambĂ©m cuidam de um tamanduĂĄ filhote que ficou para trĂĄs durante a fuga da famĂlia, alĂ©m de outros animais, como saruĂȘs, micos e ouriços-cacheiros â a maioria filhotes.
O biĂłlogo do Hfaus responsĂĄvel pelo manejo dos animais silvestres, Thiago Marques, lembra que os animais estĂŁo chegando com sinais evidentes de que buscam alimento, recurso em escassez pela degradação do ambiente original. âO DF Ă© uma ĂĄrea gigante, e, se o animal se desloca, acaba chegando Ă civilizaçãoâ, explica. âO Parque Nacional estĂĄ dentro de BrasĂlia, cercado por cidade. EntĂŁo, esgotando os recursos, eles acabam chegando a lugares inadequados e entram em conflito com os humanosâ.
Thiago afirma ainda que a demanda do hospital veterinĂĄrio tem aumentado de forma nĂtida desde que os incĂȘndios florestais começaram, e frisa que nem sempre os animais vĂŁo chegar com ferimentos causados pelo fogo â mas tambĂ©m por incidentes provocados por fuga, abandono das famĂlias, escassez de alimentos, procura de abrigo e outras questĂ”es que sĂŁo impactos diretos das queimadas.
âPercebemos um aumento de casos, por exemplo, de ataque de cachorros, colisĂ”es com carros e vidraças, alĂ©m de animais indo parar em locais urbanosâ, aponta o biĂłlogo. âAs pessoas se assustam com eles e acabam tendo esses casos de ferimentos. Nosso trabalho Ă© tentar resgatar, melhorar a vidinha deles e devolvĂȘ-los para a natureza o mais breve possĂvel. Mas a grande maioria a gente nĂŁo vai conseguir atender, que sĂŁo anfĂbios, rĂ©pteis e invertebrados que nĂŁo conseguem fugir. Eles sĂŁo a base para muitos outros; e, quando hĂĄ um problema com a base, afeta toda a cadeia alimentar.â
Como ajudar
Os profissionais do hospital veterinĂĄrio ressaltam que os animais da fauna silvestre nĂŁo devem ser tratados por civis, jĂĄ que, por mais que o animal pareça que nĂŁo estĂĄ machucado, pode estar extremamente assustado ou com fome, enfrentando dias de fuga. Foi o caso da fĂȘmea de tamanduĂĄ, que, antes de ser trazida pelos bombeiros ao Hfaus, estava correndo havia dois dias dentro da cidade.
Ao encontrar um animal na rua, filhote ou adulto, primeiramente é preciso verificar se ele estå ferido ou precisa de socorro, pois nem todos os casos exigem intervenção humana.
âMesmo que ele seja filhote, Ă s vezes a mĂŁe deixa ele em um cantinho para buscar alimento; e, querendo ajudar, a gente faz um resgate que nĂŁo era necessĂĄrioâ, pontua a chefe do Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais RenovĂĄveis (Ibama), Clara Costa. âA partir do momento em que ele Ă© retirado da natureza, hĂĄ chances de nĂŁo conseguir retornar.â
O ideal Ă© sempre acionar os ĂłrgĂŁos pĂșblicos ambientais, que atuam na linha de frente com apoio do BPMA, por meio do telefone 190, ou o Corpo de Bombeiros Militar do DF pelo telefone 193.
Destinação dos resgatados
Desde o inĂcio do ano hĂĄ um acordo de cooperação tĂ©cnica para o atendimento da fauna do DF e Entorno que envolve o Ibama, os institutos BrasĂlia Ambiental (Ibram) e Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), alĂ©m do Jardim ZoolĂłgico de BrasĂlia.A representante do Cetas, divisĂŁo do Ibama que recebe os bichos resgatados de incĂȘndios florestais, atropelamentos, colisĂ”es, apreensĂ”es ou atĂ© entregas voluntĂĄrias, ressalta que, apĂłs os animais receberam alta dos hospitais veterinĂĄrios parceiros, as equipes fazem uma avaliação fĂsica e comportamental dos resgatados, para saber se hĂĄ alguma avaria que os impossibilite de retornar para a natureza.
âIsso Ă© fundamental caso seja um animal manso ou que nĂŁo apresente os comportamentos tĂpicos da espĂ©cie que vĂŁo auxiliĂĄ-lo a sobreviver na naturezaâ, detalha. âApĂłs essa avaliação criteriosa, a gente define a destinação desses animais â que pode ser a soltura, que Ă© o objetivo final sempre, ou cativeiro, nos casos em que eles nĂŁo sobreviveriam sozinhos. Existe tambĂ©m a possibilidade de destinĂĄ-los aos zoolĂłgicos, criadouros ou mantenedores licenciados pelo Ibama.â
Por Jak Spies, da AgĂȘncia BrasĂlia | Edição: Chico Neto